Jeferson abriu os olhos, mas continuou deitado na cama dura e estreita, concentrando-se para capturar o máximo possível dos detalhes do sonho que havia acabado de sonhar: ele, com um gordo gato preto nos braços e semblante de triunfo. Sim... A sensação de alegria que experimentou no sonho ainda estava bastante viva nele. Na cama, deixou um leve sorriso desenhar-se em seus lábios, enquanto apoiava os braços sob a cabeça. Mas havia mais alguém no sonho... Fechou novamente os olhos tentando rever aquelas imagens. Aos poucos sua mãe chorando, ajoelhada no chão, com os braços para o alto, reapareceu nitidamente para ele.
Jeferson pulou da cama animado. Era hoje que ia deixar para trás aquela vida de trocados contados, noites curtas, comida pouca e muito trabalho. Daria uma vida melhor para D. Neide. O sonho era claro: só precisava apostar no bicho. Ia dar gato na cabeça!
Saiu de casa assobiando, rumo à banca do bicho que ficava na vielinha, um quarteirão acima de seu barraco. Fez a aposta e seguiu para o que seria – tinha certeza! – seu último dia na oficina. Antes, porém, comprou uma rosca na padaria e decidiu levar para D. Neide, aproveitando para dividir com a mãe suas mais doces esperanças.
No caminho até lá, chamou a atenção de Jeferson um cartaz colado em diversos postes, árvores e muros da cidade. A mensagem oferecia uma gorda recompensa para quem encontrasse Nadine, a gatinha estampada na fotografia. Os olhos de Jeferson se iluminaram. Ele havia interpretado errado o sonho! Não era o jogo do bicho que lhe traria a grana, mas sim Nadine. Ele seguiu seu caminho com a certeza de que ia encontrá-la.
De fato, já bem próximo à casa de D. Neide, um gato preto saiu de um terreno baldio em disparada, como se fugisse de algo ou alguém. Jeferson não pensou duas vezes: largou a rosca jogada na calçada e correu em seu encalço. No meio da avenida em frente à casa da mãe, Jeferson, enfim, agarrou o bichano, mas em seu momento de triunfo, não notou o ônibus da linha 203B que vinha a toda, sempre atrasado. Nem Jeferson e nem o gato resistiram ao impacto.
D. Neide, ouvindo a balbúrdia em frente ao seu sobradinho, chegou ao portão e deu com Jeferson estirado no asfalto. Depois do choque, jogou-se ao lado do único filho e, com as mãos para o céu, chorou até ser capaz de acreditar que aquilo não passava de um pesadelo.
Texto escrito pela escritora Cassiana Perez, a partir da proposta do Vivenciando a Escrita para o mês de janeiro de 2025: Um dia de Coincidências. Para conhecer os próximos temas e saber como participar, acesse aqui.
0 Comments
Seja bem-vindo ao Projeto Escrita Criativa!
Deixe o seu comentário e interaja conosco. ;)